Filmes.
Trashão de luxo.
Trashão de luxo? Que loucura é essa? Trash e luxo são tão antagônicos que jamais seriam lados de uma mesma moeda. Então, estou me contradizendo? Ou teria este blogueiro ter fumado maconha estragada antes de entrar na net? Nem uma coisa, nem outra. Calma galera! Antes que alguém pense que estou surtando, deixe-me explicar.
Em 2007, os geniais e criativos diretores/roteiristas Quentin Tarantino e Robert Rodriguez tiveram a original ideia de homenagear os filmes trash de terror dos anos 60/70, que na época eram exibidos em sessão dupla, com os trailers de outras produções entre eles. Surge então o Projeto Grindhouse, com dois filmes: Planeta Terror (ainda inédito para mim), escrito e dirigido por Rodriguez, e À prova de Morte (comentários em: http://blogdorickpinheiro.blogspot.com/2010/09/muita-conversa-mole-e-pouca-acao.html ), escrito e dirigido por Tarantino, que foram exibidos junto com quatro trailers falsos. Infelizmente, o público norte-americano não compreendeu a criativa ideia dos gênios figurinhas repetidas, motivo que fez os dois filmes chegarem ao Brasil divididos e com um absurdo intervalo de tempo entre eles.
Mas, nem tudo foi desastre desta ideia tão original e injustamente incompreendida. Um dos trailers falsos acabou virando mesmo um filme. E depois de três anos, chega aos cinemas, o verdadeiro filme Machete, homenagem aos trashões de ação, dirigida por Robert Rodriguez, que assistir hoje pela manhã, na tradicional Sessão Cinema de Arte, do Cine Maceió 2.
Na trama, Machete (Danny Trejo) é um durão policial mexicano que, nos primeiros minutos de filme, cai numa armadilha fatal do traficante Torrez (Steven Seagal) que mata sua família e o fere gravemente. Três anos depois , sem nenhuma explicação como escapou da morte, o feioso herói é imigrante ilegal nos Estados Unidos, quando é contratado por Michael Benz (Jeff Fahey), para assassinar o Senador McLaughlin (Robert De Niro), em campanha à reeleição, cujo o principal projeto é a expulsão dos imigrantes ilegais. Só que o atentado na verdade é uma farsa política, gerando outra armadilha para Machete. O resultado, resume-se a uma das frases marcantes, ditas por ele: "Escolheram o mexicano errado para ferrar!". Depois daí, já imaginam (ou não), o que acontece.
O roteiro é excelente, com cenas de ações bem surreais, que, apesar da extrema violência, típicas dos trashões de ação, arranca gargalhadas do público, justamente, pelos exageros e absurdos. Além de ser uma homenagem, e tanto, aos filmes de ação trash, o filme também faz uma crítica direta a hipocrisia da classe política, principalmente, em época de campanha eleitoral. Apesar de absurdas e totalmente preconceituosas, graças a sua lábia típica dos políticos safados, o senador interpretado por De Niro, consegue até deixar dividido os próprios mexicanos, principais prejudicados do seu projeto barrista. No discurso inflamado, preconceituoso, mas disfarçado de patriotismo, enconde-se o fato da campanha do senador ser financiada pelo traficante Torrez, que, evidentemente, quer em troca os seus negócios do narcotráfico ampliados.
Como homenagem aos trashes, as interpretações não poderiam ser mais ideais. Robert De Niro, sem dúvida, é o melhor ator do elenco, mas, isso não quer dizer que ele seja o único destaque no filme. Danny Trejo, primo do diretor, depois de anos de carreira como coadjuvante, parte dela atuando em filmes dos primão talentoso, finalmente protagoniza uma obra, e não decepciona, convencendo como o durão Machete. Michelle Rodriguez, é outra que não decepciona, fazendo uma personagem mais feminina e menos durona, do que costuma fazer. Cheech Marin, outra figurinha obrigatória nos filmes do diretor, cumpre seu papel, nos divertindo como o surreal Padre Benito Del Toro (note que o nome é um trocadilho com o nome do ator Benício Del Toro).
Agora, a grande supresa mesmo são os canastrões. Rodriguez reuniu um elenco de canastrões de primeira. Para sua homenagem, recrutou duas péssimas atrizes da atualidade (a lindíssima Jéssica Alba e a chatíssima bad girl Lindsay Lohan) e três decadentes e toscos astros de filmes de ação classe "Z", dos anos 80/90: Jeff Fahey, Don Johnson (que também estrelou a série televisiva Miami Vice) e ninguém menos que ele, Steven Seagal, considerado por muitos o pior ator de todos os tempos. As atrizes, infelizmente, não aproveitaram a oportunidade oferecida pelo diretor, e não conseguem convencer (fraquíssimas demais, principalmente Lohan, mas nenhuma delas comprometem o resultado final.), ao contrário da ala masculina do cast canastrão. Espantosamente, todos, inclusive o barrigudo Seagal, convencem em seus personagens. Não que a arte da interpretação tenha despertado neles, de uma hora para a outra, pois continuam com a mesma falta de talento. Mas, o mérito é de Rodriguez, que sabendo da falta de talento dos escalados, criou personagens à "altura" de cada um, que assim como seus personagens, não são levados à sério.
Destes, o destaque é, supreendentemente, Steven Seagal, que está hilário, numa personagem que é uma paródia de si mesmo, com direito a usar uma espada como fazia em seus primeiros (e bons) filmes. Impossível não cair na risada, por exemplo, todas as vezes que aparece pela tela do notebook, cumprimentando os seus comparsas pela alcunha de "puñeta" ou no desfecho tragico-cômico do seu tosco personagem. Rodriguez presenteou Seagal com o melhor e mais original personagem da sua tosca carreira. Querendo, Steven Seagal pode se aposentar agora mesmo, feliz da vida por, finalmente, fazer um personagem memorável e divertido, diferente dos, quase sempre, (ex) policiais e (ex) agentes da CIA, da sua medíocre filmografia.
A trilha sonora é outra ponto alto do filme. Contagiante e envolvente, as músicas são devidamente encaixadas nas exageradas e toscas (propositalmente, é claro.) cenas de ação, onde Machete e cia, fazem jorrar sangue, cabeças e membros para tudo que é lado, ao som de guitarra e violão, bem ao estilo de música mexicana. Mais um ponto positivo do filme, que só reforça a homenagem que o filme pretende prestar, aos trashões de ação.
Para mim o único ponto negativo do filme foram algumas poucas cenas apelativas, mesmo que este tipo de cenas estejam presentes nos trashões homenageados. Mas, a cena de sexo à três do protagonista com a esposa e filha do vilão e o tiroteio dentro de uma igreja ao som da Ave Maria, apesar de bem realizadas, não funcionam, sendo as cenas mais fracas e, portanto, descartáveis, deste excepcional filme. Mas nem mesmo estas tiram o brilho desta obra-prima.
Em síntese, Machete é um filmaço tosco, e por mais que pareça, esta afirmação também não é contradição. Por ser propositalmente tosco e muito bem realizado, o resultado é mesmo um filmaço excepcional. Original e divertido, não somente cumpre perfeitamente a homenagem a que se propõe, sendo infinitamente superior aos homenageados, como também é original e divertido, graças aos exageros, que superam muitas paródias sem graça produzidas nos últimos anos. Uma obra-prima do cinema atual, que cada vez mais vem se esvaziando de criatividade. Nota 10,0.
Rick Pinheiro.
Cinéfilo.
Como antigamente: material divulgação, com cenas do filme. Abaixo, o trailer que originou este filmaço tosco. |
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